08
abr
2018
Koe no Katachi: um filme sobre o bullying
Estou há séculos tentando escrever algo sobre esse filme pra vocês, mas é que a história mexeu tanto comigo, me marcou tão profundamente que demorei pra absorver toda a mensagem que ela passa. Indico muitíssimo que vocês assistam, mesmo que não gostem de animes, esse vale muito a pena assistir.
Koe no Katachi conta a história de Ishida, um típico valentão do ensino fundamental, que adora aquelas brincadeirinhas ofensivas em cima dos outros. Assim que Nishimiya, uma menina surda, entra na turma dele, ela se torna o alvo das brincadeiras maldosas. Acontece que, após alguns acontecimentos desagradáveis, Nishimiya troca de escola e Ishida é visto como o culpado de tudo, tendo que arcar sozinho com as consequências e o julgamento dos colegas (quando alguns deles também participaram do bullying). Mas o filme não para por aí, acompanhamos a trajetória de Ishida quando, no ensino médio, ele semostra arrependido e profundamente marcado por tudo que fez no ensino fundamental e, tentando construir uma amizade com Nishimiya, querendo se redimir de seus atos.
Koe no Katachi não é um romance, apresar de parecer. É um drama que mexe profundamente com as emoções do telespectador. As cenas de bullying são fortes, nos causam angústia, raiva, tristeza. Uma sensação de impotência misturada com ódio pelas atitudes do protagonista. Mas o diretor do filme não focou nisso, ele foca no processo de evolução do personagem. O filme tem uma transição sutil da fase do bullying pra fase de arrependimento e transformação, de maneira que não conseguimos manter a raiva pelo protagonista, por mais que suas ações tenham sido deploráveis. O que sentimos é pena, porque além dele machucar a Nishimiya com suas atitudes ele acabou machucando a si mesmo também e teve que conviver com as marcas disso por anos.
Algumas partes do passado são contadas através de flashbacks, de maneira que vamos construindo o quebra cabeças aos poucos. O modo como Ishida passou de valentão à vítima do bullying, o modo como todos viraram as costas para ele, fazendo com que ele lide com a culpa sozinho até chegar ao ponto de uma profunda depressão. Ele se encontra num estado onde se isolou do mundo, o que é evidenciado pelo modo como não encara ninguém nos olhos, como os outros personagens tem um X no rosto, dentre outras coisas.
O modo como o diretor escolheu desenvolver a história chega a ser poético, porque ele não mostra nada tão explicitamente, algumas coisas ela deixa evidenciado pela animação, pelo desenho em si para nossa interpretação.
O interessante do filme é que ele aborda um ponto diferente sobre o bullying. Aqui não temos o esteriótipo do agressor e do agredido. Ele trata todos como vítimas do bullying porque são todos atingidos por ele de alguma maneira, sofrendo com os impactos dele de formas diferente em suas vidas.
Aqui vemos o relacionamento dos personagens com a família, o modo como vêem a si mesmos e aos outros, vemos o modo como cada um decidiu seguir sua vida após o bullying e como ele tentam superar isso e recuperar os laços perdidos ao mesmo tempo que lidam com os traumas criados. Mas, principalmente, vemos a trajetória dos personagens em busca de perdão, seja para perdoarem a si mesmos dos pensamentos que tinham sobre si próprios, ou perdoar as agressões sofridas.
Koe no katachi é um filme que vai além do bullying, ele trata sobre mudança, sobre transformação, redenção, perdão. É interessante essa história de "pagar pelos seus pecados", porque a verdade é que quando uma pessoa age errado, poucos são os capazes de dar valor para uma tentativa de mudança sem jogar os erros na cara da pessoa, sem fazer com que ela se sinta marcada pelas atitudes erradas que cometeu.
Acredito que esse é um filme obrigatório para todo mundo porque obriga a gente a refletir, nos mostra, de maneira sutil e ao mesmo tempo com uma carga emocional e dramática intensa, os efeitos do bullying na vida das pessoas e não só do bullying, mas as dificuldades (usando de um eufemismo) de qualquer um que tenha cometido erros e está tentando recomeçar.
É um filme impactante, intenso, que mexe profundamente com nossas emoções e que não pode ser explicado por uma resenha, por mais que eu tente, tamanha a profundidade da história. Só posso indicar com muita ênfase que vocês assistam - e não esqueçam os lencinhos porque as lágrimas são inevitáveis.